Além das suspeitas de lançar “laranjas” nas eleições de 2018, o PSDB foi acusado de não prestar qualquer apoio a algumas candidatas. É o caso da cantora Lucimara Fagundes, 35 anos. No ano passado, ela concorreu a uma vaga de deputada distrital pela terceira vez. Inconformada com a falta de apoio, a cantora gospel denunciou o PSDB ao Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) e diz que processará o partido. O MPDFT encaminhou o caso à Procuradoria-Geral Eleitoral, do Ministério Público Federal (MPF).
Na versão de Lucimara, foi o presidente do partido, o senador Izalci Lucas, que pediu para que ela tentasse se eleger. “Eu nem queria ser candidata. Quando me decidi, pensei que o partido me daria todo o apoio, que teria o meu aparato financeiro para colocar o meu pessoal nas ruas e fazer uma campanha digna. Mas eles [integrantes do PSDB] falaram que iriam impugnar a minha candidatura porque reivindiquei os meus direitos”, conta.
Veja o depoimento:
Segundo a ex-candidata, houve muitos desentendimentos dentro do PSDB em torno dos pleitos femininos. Para ela, algumas candidaturas foram preteridas em virtude de outrase muitas existiam apenas no papel e tiveram verbas direcionadas para outras postulantes dentro da legenda.
“O PSDB contratou uma empresa que exigiu a nossa conta bancária e senha. Me recusei a assinar. Meu advogado disse que eu não precisava concordar com isso para receber o recurso, tanto que preenchi o requerimento e estava apta. Preferi contratar profissionais e fazer eu mesma a minha prestação de contas”, diz Lucimara. Até o momento, as informações não constam no site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Falta de apoio
Outra candidata a deputada distrital pela legenda, que pediu para não ter o nome divulgado, disse também não ter recebido recursos para a produção de material de campanha, deslocamento e contratação de serviços.
Membro da igreja Ministério da Fé, em Taguatinga, da ex-deputada Sandra Faraj (PR), ela tinha a intenção de tentar vaga pelo mesmo partido da pastora mas, quando foi consultar o sistema do TSE, descobriu que já era filiada ao PSDB. “Eu tinha essa filiação e nem sabia. Preenchi uns formulários em uma reunião na época do Roriz e não sabia que aquilo era uma ficha de filiação. Como já queria ser candidata, saí pelo partido mesmo”, lembra.
Segundo ela, houve a promessa de repasse de R$ 2 mil para a produção de santinhos, sob a condição de o material vir casado com as fotos dos então candidatos ao Senado Izalci, ao GDF Alberto Fraga (DEM), e à Presidência da República Geraldo Alckmin (PSDB). “Como não apoio nenhum deles, não aceitei. Me senti sabotada”, disse.
A mulher também denuncia que as responsáveis pelo PSDB Mulher marcavam reuniões e avisavam apenas algumas candidatas. “Só chamavam as que interessavam ao partido.”
Extratos
Guilherme Sturm, sócio da Essent Jus, empresa de prestação de contas mencionada por Lucimara, diz que a companhia solicitou apenas a senha que dá acesso à emissão de extratos bancários, para acompanhar a movimentação e informar ao TSE, dentro do prazo estabelecido pela legislação, toda movimentação financeira da campanha.
“A senha tem a finalidade de servir ao contador, ela não movimenta a conta. O nosso interesse é fazer a prestação das contas com a maior transparência da destinação desses recursos, sobretudo os do fundo especial”, explica Sturm. Em 2018, a empresa Essent Jus, com sede no Rio Grande do Sul, atendeu 14 legendas.
Para o advogado especialista em direito eleitoral Bruno Beleza, não existe uma regra que obrigue o partido a distribuir, de forma igualitária, a verba da cota feminina. “Se o partido quiser, pode colocar todo o dinheiro na campanha daquela candidata que a legenda considera ter mais chances de ser eleita. O que precisam cumprir é o requisito: se receberam R$ 10 milhões, têm de destinar R$ 3 milhões para as mulheres”, detalha.
“Não há irregularidade”
O também advogado Bruno Rangel, especialista em direito eleitoral, faz coro ao colega. Para ele, questões relativas à divisão da cota devem ser tratadas e resolvidas internamente. “O financiamento não é exclusividade do partido, o candidato também pode buscar recursos e apoio de outras formas”, explica.
Para Rangel, ainda que pesem suspeitas de que as candidaturas tiveram apenas a finalidade de atingir os 30% de mulheres, tal prática não chega a ser classificada como candidatura laranja.
“Os motivos pelos quais uma candidatura laranja ocorre são os mais variados. Pode ser uma candidatura fictícia, que só existe no plano formal. Geralmente, a postulante nem sabe e, em alguns casos, pegam-se os documentos, inserem-se os dados sem que a pessoa tenha conhecimento. Para saber se uma candidatura existiu de fato, é preciso observar uma série de fatores, e não apenas o número de votos”, afirma Rangel.
Já Bruno Beleza explica que a combinação do recebimento de altos valores, votação pífia e destinação de recursos para empresas de familiares, amigos ou de pessoas ligadas ao núcleo de um partido podem caracterizar uma candidatura laranja.
Procurado pela reportagem, o presidente do PSDB-DF, Izalci Lucas, negou qualquer irregularidade e disse que as decisões foram tomadas pela Executiva Nacional.
“O PSDB foi o primeiro partido no Brasil a adotar cota de 30% para mulheres, antes da decisão do STF. Não há obrigatoriedade de destinação a A, B ou C. Aos partidos interessa [as vagas de] deputado federal e, normalmente, o partido ajuda os federais que têm mandato. A [Executiva] Nacional ajudou quem tinha potencial. Os distritais geralmente nem recebem, eles têm ajuda dos candidatos a deputado federal”, explica Izalci.
Segundo ele, a denúncia ocorreu devido à falta de conhecimento sobre as normas. “Entrar com representação no Ministério Público sem saber de nada é manifestação de ignorância. Não há irregularidade, só falta de conhecimento da legislação”, disparou o senador.
Fonte: Metropolis
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