O relator da ação contra a ex-parlamentar, desembargador Silvânio Barbosa dos Santos, julgou improcedente a denúncia do MP, votando pela absolvição. Segundo ele e outros 16 desembargadores, Liliane não pode ser responsabilizada pelas ações do patriarca. “Não se pode esquecer que requisitos para a cegueira deliberada são imprescindíveis de elementos concretos sobre a ilicitude do ato. Quais elementos concretos na época do delito, 2006, seriam capazes de gerar na mente que seu genitor, político de renome nacional, pecuarista, estaria envolvido em conluio?”, ponderou.
Segundo o MPDFT, Joaquim Roriz teria usado a influência política para intermediar a concessão e a repactuação de financiamento junto ao Banco de Brasília (BRB) para beneficiar a WRJ Engenharia de Solos e Materiais. Em troca, a empresa teria entregue a Roriz e familiares 12 apartamentos como pagamento de vantagem indevida.
O MPDFT foi representado no julgamento pela vice-procuradora-geral de Justiça Jurídico-Administrativa, Selma Sauerbronn. Segundo ela, a filha da ex-distrital, Bárbara, ficou com as unidades 1001 e 1103 do residencial. Outras foram distribuídas a demais familiares do clã. “Não deixam dúvida que os 12 imóveis não somente foram transferidos para eles como foram usufruídos”, sustentou.
Outra prova do esquema fraudulento apresentada pelo Ministério Público é a aquisição, em 3 de abril de 2007, de 193 hectares de terra da Fazenda Jacobina, em Luziânia (GO), por meio de agropecuária que seria de ex-empregados da família, no valor de R$ 350 mil reais. O negócio teria sido feito “em troca do repasse de duas das 12 unidades residenciais recebidas pela WRJ”.
“Não há na denúncia qualquer afirmação de que os imóveis teriam sido doados, mas que teriam sido entregues aos réus como vantagem indevida. Obviamente não foi lavrada escritura pública nem registro em cartório. A acusada atuou no mínimo cegamente e de forma deliberada”, destacou a vice-procuradora-geral do MPDFT.
O revisor, desembargador João Timóteo de Oliveira, seguiu o voto do relator e decidiu pela absolvição. Para o magistrado, a influência política não está caracterizada nos autos em relação a Liliane. “Consta a regularidade do financiamento. Não há provas que Liliane teria infligido nas negociações para financiamento e renegociação da dívida”, declarou. Apenas um votou pela condenação: o do desembargador Humberto Ulhôa.
Ao proferir voto pela improcedência da ação penal, o desembargador Diaulas Costa Ribeiro citou Joaquim Roriz como o cérebro da família. “O negócio envolvendo os 12 apartamentos é manifestamente nebuloso. É preciso colocar a acusada em seu lugar: de filha de patriarca protetor e defensor. Não vejo nenhum elemento nos autos que tenha demonstrado que Liliane tenha tido condições de ter autonomia e exercício crítico das ações do pai.”
Defesa
Mesmo com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que limitou o alcance do foro privilegiado, a competência do julgamento da ação contra Liliane, que não é mais parlamentar, permaneceu no Conselho, pois o processo estava em alegações finais à época da determinação.
No entanto, o advogado de defesa Eri Varela defendeu que o processo voltasse a uma instância inferior, para apreciação de um juiz singular, uma vez que Liliane não era deputada na época dos fatos e, agora, não exerce mais mandato parlamentar. “Fico a indagar e a pensar, diante da exposição tão grande da subprocuradora, se não seria mais crível descer os autos e declarar incompetência?”, ponderou.
Varela considerou que o MPDFT voltou a apresentar novos documentos após as alegações finais. “A defesa entende e requer em questão prejudicial, considerando que tais fatos não estão vinculados ao exercício de mandato.”
O defensor também sustentou que não há “nenhuma prova de influência de Joaquim Roriz”, conforme denuncia o MP. “Não consta nos autos que o governador tenha solicitado, pedido ou autorizado. O empréstimo seguiu o padrão natural do banco. A propriedade resta alienada fiduciariamente. Alienada, nenhuma unidade poderia ser negociada sem a anuência do banco, o credor”, disse Varela. “Nenhuma das unidades foi ocupada pelos membros da família.”
Argumentou, ainda, não haver crime antecedente para caracterizar a lavagem de dinheiro, ou seja, não há ciência do delito. “Não posso lavar, esquentar, embranquecer aquilo que não sei se é crime ou não. Preciso ter a ciência inequívoca porque esse é o elemento subjetivo de integração ao crime”, disse o advogado. Segundo ele, Liliane “não fechou a operação, não deu os 15 mil de sinal e não pagou as parcelas”.
Na análise da preliminar sobre a competência da Corte, o relator defendeu que a competência para julgar o processo é do Conselho Especial. “Eu interpreto que a exceção se aplica a qualquer ação penal”, declarou. Apenas o desembargador Sérgio Rocha divergiu, alegando que os fatos que teriam sido praticados por Liliane não têm a ver com o mandato e, por isso, não haveria foro.
Em nota, o MPDFT informou que vai avaliar a possibilidade de recurso.
Memória
Em maio de 2016, o Conselho Especial do TJDFT acolheu, por unanimidade, denúncia contra a então deputada distrital Liliane Roriz por lavagem de dinheiro. A investigação aponta que os imóveis foram objetos de crimes relacionados ao desvio de dinheiro supostamente praticados por Roriz e outros réus em ações penais diferentes. O ex-chefe do Executivo local, funcionários do BRB e proprietários da construtora foram investigados pela prática de corrupção passiva e ativa.
A defesa da então deputada alegou, à época, que o processo não deveria prosseguir, pois não descrevia adequadamente as ações de cada autor. Liliane também argumentou que a Constituição Federal prevê que nenhuma acusação pode ultrapassar as pessoas que participaram de um eventual crime e a impossibilidade da configuração do crime de corrupção passiva e a inexistência de crime anterior impedem a caracterização do delito de lavagem. Sustentou, também, que não tinha ciência de qualquer tratativa feita pelo seu pai em relação ao tema tratado na denúncia.
Condenada
A ex-distrital já foi condenada em ação penal por compra de votos e fraude eleitoral nas eleições de 2010, pelo Tribunal Regional Eleitoral do Distrito Federal (TRE-DF). Em junho de 2018, o ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Luiz Fux determinou a execução imediata das punições impostas a ela.
Na ação penal foi analisada a responsabilidade criminal de Liliane Roriz pela omissão, na prestação de contas eleitorais, de informação sobre o recebimento de doações em dinheiro e realização de gastos de campanha, além de promessa de nomeação em cargo público a eleitores se ela viesse a ser eleita.
A herdeira do clã Roriz foi inicialmente condenada a 4 anos, 5 meses e 8 dias de prisão em regime semiaberto e a multa de R$ 32,4 mil. A reclusão, no entanto, foi substituída por pena restritiva de direitos, como prestação de serviços à comunidade. Liliane recorreu do veredicto do TRE-DF e levou o caso ao TSE. O pedido de revisão da condenação ainda será avaliado pela corte superior.
Fonte: Metropolis
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